Ontem, fiz planos, quis escrever. Peguei o caderno comprado só pra isso, reli os textos de dois anos, analisei a mudança da minha linguagem... Analisei a forma objetiva, direta, sem rodeios, que caracterizava minhas palavras. Vi que as mesmas palavras continuam vivas com a mesma intensidade dentro de mim, mas em silêncio, silêncio cansado por tentar provar que é verdade. De tanto ver olhares duvidosos, guardei tudo só pra mim: a angústia, a saudade, os planos interrompidos, o amor. Guardei tudo só pra mim. Algo, em partes, até bom, porque não preciso convencer ninguém de minhas certezas. Li tudo que eu tinha escrito, lembrei das margaridas brancas que odeio, lembrei do cheiro das margaridas e do incenso, relembrei sem querer. Era o caderno. É... o caderno... deveria ter pego outra folha qualquer. Com a mão fraca, soltei a caneta. Tentei conversar, enviar uma mensagem, falar, pedir. Tentei, porque o sono é sempre mais forte. De novo deixei de lado minhas prioridades por estar cansada.
Lembro desse mesmo dia três anos atrás. Lembro sempre desse dia. Sei as roupas, a mesa, as cadeiras. Lembro de ver o sorriso de longe enquanto o ônibus fazia a curva. Celofane amarelo e o sorriso na rua, ao mesmo tempo do meu sorriso enquanto assistia. Aquele sorriso. Passo todos os dias ali, e sempre na mesma curva olho a calçada lembrando (cadê palavra que traga você daquela calçada?)... todos os dias. Lembro e desejo rever, desejo voltar, desejo por um milagre que aqueles segundos se repitam. Nem sei se hoje minha revolta era mesmo tanta (tanta pelos motivos que fiz parecer serem principais). Talvez minha maior revolta tenha se misturado, revolta pela ausência, revolta que volta a cada rosto que vejo me confundindo (sem ser, sem nunca poder ser). Talvez eu tenha dado um nome à isso pra poder gritar um pouco, em disfarçe, a saudade que agora escancaro indevidamente.
Acordei, lembrei do mesmo dia três anos atrás, desse e de outros, de tantos. Lembro dos olhos, de ouvir o que me disse. Passei o mesmo perfume (e a poesia que meu olho molhava ali), aquele, guardado. Peguei a caixa em cima do armário, abri, olhei por alguns segundos, pensei em abrir as cartas - não me senti capaz (quem sabe não me caiba). Depois guardei tudo impetuosamente, peguei a chave e saí emudecendo minha mente (nuvens, chuva... "até o céu chora," lembrei o quanto repeti isso há dois anos). Assim foi. O perfume me trazendo de volta alguns flashs (quem sabe seja sua). O coração apertando por serem só flashs.
Voltando aos planos, eu ia hoje lá com uma rosa, como em todas as vezes. Mas, pra não encontrar nada? Pra talvez me perder? Não sei qual seria minha reação. Não fui. E agora não sei como falar o que quero, não sei como enviar minhas palavras, não sei como sentir por perto. Pelo menos hoje, um pouco mais perto. Pelo menos mais uma vez.
"Há três anos..." o tempo escorre pelas mãos. Esse perfume me leva de volta àquele tempo. Me distraio e acho que estou lá, então lembro que não estou. Respiro mais uma vez, me transporto, fecho os meus olhos, visualizo outros, giromepercohojenãoqueroantesvoltavoltavolta... assim palavras e palavras gritam.
Ando me estorvando de não viver o que planejei. Ando cansando desse descontrole. Me pego, em alguns momentos, como uma velha rabujenta, condenando fogo de palha, cansada de incertezas, cansada de efemeridades, de superficialidades. Ando cansando de coisas tão físicas, tão vazias, tão exclusivamente táteis. Ando saudosa de sentir com concretude, dos meus planos, da vida que criei pra mim. Ando cansada de tanta imaturidade, de todas as complicações dispensáveis, até das minhas. Ando querendo jogar fora tudo que parece não valer, tudo que se paraliza, tudo que se mantém na superfície (e por isso se torna preterível), a inatingibilidade do essencial, a contigüidade necessária que não se alcança, tudo que parece sem dimensões futuras, tudo que passa e não fica.
Alguns vazios são permanentes. Não adianta tentar preencher. Não adianta tentar matar fome com água. Não adianta procurar a imagem em outras imagens pra tentar resgatar um segundo daquele instante. Sinto, por vezes, formigamentos na mão ou no rosto e torço tanto pra significar algo mais. Erro meu?
é um mundo e dentro um mundo...
seu dia: feliz aniversário!
terça-feira, 30 de setembro de 2008
miragem minha, monte atrás de monte...
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